quinta-feira, 26 de maio de 2011

Por que não dizer "sim"?

Eu queria refletir sobre uma coisa por aqui.

O relacionamento amoroso é uma espécie de jogo, em que o homem é o desbravador e a mulher, a definidora do resultado.

Na maioria das vezes, quando um cara se dispõe a conquistar uma mulher, precisa se armar de preparo e jogo de cena. Porque existem coisas que devem ser ditas; outras não podem ser feitas; um terceiro grupo tem boas chances de dar certo; um quarto deve ser abolido imediatamente, sob pena de tirar o cidadão do jogo.

É uma dinâmica muito bem entendida, principalmente pelo lado feminino da coisa. Está no DNA dela não dar as caras logo de primeira. Se sai do forno um convite para sair, o "não" é a primeira reação - que pode nas entrelinhas significar "tente novamente", ou "não tô afim", mesmo.

E aí, eu pergunto: se o cara é legal, por que não um "sim"? Por que esse medo de parecer "fácil"? Afinal, ninguém disse que vai dar namoro logo de primeira. Nenhuma mulher vai ficar com qualquer "fama" porque decidiu conhecer um cara - nem que isso acabe somente em amizade.

Muitos homens gostam desse jogo de conquista, e ganhar fácil demais perde a graça. Mas nem todos têm a segurança brutal que a sociedade dita "machista" exige. Esse cara, se enxergar uma negativa, pode até desistir e partir pra outra.

Sei lá... talvez eu seja um extraterrestre e o jogo tem de ser assim. Mas às vezes eu penso que as pessoas poderiam ser mais generosas e abrir mão de convenções - se a mulher dificulta demais, pode perder a chance de conhecer uma pessoa legal.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

O céu ganha um guerreiro

Ai, ai, Meu Deus. Sua mão que me conduz
Do infinito, tão bonito fio de luz
Acalentando o meu pobre coração

Era uma das últimas tardes de domingo do século XX. Ia enfim encontrar aquele pessoal maravilhoso que só conhecia por e-mail. A Sociedade Amantes do Samba Paulista faria um encontro de fim de ano.

O evento aconteceria na quadra da Tom Maior. Filha direta do grande Camisa, a vermelho e amarela sumarense vive a nômade sina de não fixar o pé num canto. Sempre haveria alguém a destituir-lhe da quadra. Aquela ficava na Doutor Arnaldo.

A esconder os cacos de tanta luta, ele saía pela quadra a espalhar sincero sorriso. Não se furtava a cumprimentar quem por ali estivesse. Num dos dias mais incríveis da minha vida, em que experimentei pela primeira vez a magia de um ensaio, Marko, o Presí, estava presente. Vim a descobrir um tempo depois que era irmão de Marcelo, jogador de futebol que estudou comigo no Max.

Como já dizia um certo Ernesto, era firme sem perder a ternura. Nos ensaios, pedia para que os componentes não esmorecessem no canto e se organizassem na aquisição de fantasias.

No fim de 2007, fui à final em que o grande amigo Barba concorria ao lado dos parceiros Jelleya e Alemão com uma verdadeira "patada de urso" - gíria sambística para designar um daqueles sambas inesquecíveis. A letra tinha variações linguísticas e rítmicas muito interessantes. Mas, infelizmente, perdeu a disputa para uma composição a meu ver mais pobre - mas é do jogo da vida. A composição vencedora se transformou na voz do grande Renê Sobral, e com ela a Tom conquistou uma inédita vaga no desfile das campeãs.

Liderar a Tom nunca foi tarefa fácil. Além de sofridamente andarilha, a escola nunca foi das mais abastadas. Mesmo assim, sempre arrumou um jeito de deixar uma marca. A bateria de Mestre Carlão escandalizou as rígidas estruturas do batuque ao promover uma sinestesia entre ritmo e dança. Se não inovava, aperfeiçoava e escancarava.

Um povo então renasceu. Em 2009, Angola teceu um manifesto inesquecível... na caminhada de um povo esquecido. A comissão de frente exalou forte uma emoção que me pegou de jeito. E chorei como nem minha escola de coração conseguiu. No ano seguinte, a Brasília em vermelho e amarelo conseguiu ficar de pires na mão. Balançou... mas a guerreira do guerreiro não cai assim tão fácil.

O lindo ensaio no Sumaré se transforma na minha despedida. Não! Este sambista não dormirá jamais. Já dizia Brecht que são imprescindíveis aqueles que lutam a vida toda - quis o Criador que este voltasse para a sua Morada. A luz da alma que sempre refletiu em Tom Maior agora emana da eternidade. Obrigado por tudo, presí.

Lá no céu pipa vagueia
Pensamento que passeia
Criança no espaço sideral

Não há "gente diferenciada" por aqui

Confesso que li com algum ranço a chamada principal da edição desta semana da sãopaulo, a nova Revista da Folha.

Indo na esteira do protesto do Movimento Viva Higienópolis contra a construção de uma estação de metrô na Avenida Angélica, a publicação correu atrás de movimentos semelhantes realizados por outras associações de bairros listados como "nobres", pelo alto poder aquisitivo que comportam.

Ao ler o conteúdo, tive de me desarmar um pouco. As reivindicações de tais grupos, muitas vezes legítimas, primam pela discrição. A Sociedade Amigos da Vila Inah, no Morumbi, se cotizou e contratou um escritório de advocacia e um especialista em transporte para contestar a construção de um monotrilho na região - alegaram a falta de um projeto básico para a obra, que poderia gerar um novo "minhocão" (quem não é da cidade talvez não saiba que este é o apelido de uma horrenda via elevada que cruza o centro da cidade e possibilitou a degradação de seus entornos).

Defender os interesses de sua comunidade é mais do que legítimo num país que se pretenda livre. Tais movimentos podem até dar mais subsídios para movimentos de orientação mais ampla - como questionar a legalidade de um aumento de tarifa de ônibus, por exemplo.

O mais cruel nessa história toda é a grana alta fala mais alto no quesito eficiência. Passeatas e estridência, além de não necessariamente redundar e resultados, joga os manifestantes contra os cidadãos.

Até que ponto, no entanto, o interesse privado deve se sobrepor ao público? Muitas vezes as iniciativas embutem preconceitos. A declaração da dona Florinda higienopolitana que não queria se misturar à gentalha "diferenciada" que viria com o metrô não é exatamente uma frase jogada ao vento. Suspeita-se que a mesma motivação tiveram moradores da região da Avenida dos Três Poderes, no caminho do Morumbi, que venceram uma queda de braço contra estação de metrô de mesmo nome por ali.

Mesmo a possibilidade do aumento de insegurança não é justificativa para barrar um empreendimento tão essencial numa cidade sufocada pelo inferno do trânsito nos horários de pico. As obras do metrô, aliás, conseguem andar em marcha ainda mais lenta do que os 7 milhões de veículos paulistanos. Se a delinquência é problema, que haja mais iluminação e postos policiais nos entornos das estações - ora, a Cracolândia não impediu o renascimento da Sala São Paulo, que abriga uma Orquestra referência internacional.

Se por um lado é salutar à democracia a proteção aos protestos de motivação privada, é preciso também aprender com tamanha mobilização em nome de um bem maior - a cidade de São Paulo.

sábado, 21 de maio de 2011

Vanessa, a "Paula" da minha vida

Pena, que pena
Que coisa bonita
Diga qual a palavra
Que nunca foi dita

A primeira semana de aula estava prestes a terminar. E a última aula, Antropologia Cultural, não parecia dar futuro. O professor, Celso Prudente, parecia saído de um clássico da literatura de tão difícil que falava. Num instante, para me chamar a atenção, o cara virou pra mim e disse:

"Ô ilustre, mora aqui. Depois, você deriva"

Que diabos era aquilo? Talvez significasse que eu devesse me concentrar mais na aula, ou algo assim. A verdade é que o Celsão era doidaço, mas também muito boa gente. E o nosso amigo serviu de ponto de partida para uma das histórias mais bonitas da minha vida - Vanessa.

Na saída para o ponto do ônibus, divagamos sobre aquela aula nada ortodoxa. Fui no mesmo ônibus que ela - não sei se Shopping Continental ou Jardim Maria Luiza, mas era um desses. Só sei que era caminho para casa e a acompanhei. E cada vez mais nos sentimos de alguma forma afinados.

Também juntos ríamos e nos perdíamos. Uma vez, na aula de História da Comunicação, o José Maria das Neves balbuciava a sua aula, e nós não prestávamos lá muita atenção - porque a base da nota era um trabalho de temas prestabelecidos. Aí, ela levanta a mão e pede para ele falar mais alto. Ao que ele responde: "Minha filha, a aula já acabou!"

Descobri que, quando cantava os tantos sucessos da MPB, sua voz parecia deslizar o horizonte, de tão poderosa. Como ela sempre fora! Assim aconteceu naquela viagem ao Pontal do Paranapanema, para onde fomos desenvolver uma série de trabalhos. Uma jornada das mais inesquecíveis.

Vanessa era explosiva e acolhedora. À época, namorava Roberto, um sujeito às vezes brigão, mas de um coração que mal cabia em si de tão grande. No meu 22º aniversário, os dois me ligaram para dar os parabéns. Parece pouca coisa, mas pra mim significou muito - eu nunca fui dos mais populares. Ganhava cumprimentos tão somente dos familiares.

No último ano, tive de me ausentar da faculdade para tocar um projeto experimental que se revelaria mais tarde um fracasso. Ouço então um recado dela na minha secretária: "Estou preocupada. Você não tem ido à faculdade". Nunca havia pensado que alguém sentiria a minha falta.

Fui uma espécie de quinto elemento de seu trabalho final. Eles fizeram um documentário sobre a cidade de São Paulo, e eu fiz a narração. Mesmo não fazendo parte do grupo de forma oficial, fiquei feliz de ter feito parte daquela iniciativa, que tirou nove e meio.

Na festa de formatura, descobri que a vida real, às vezes comum, pode de quando em vez guardar lances extraordinários. Minha mãe tinha acabado de perder minha avó e meu tio para a Eternidade, e se sentia um tanto sozinha. E o Negro de felicidade se unia a um Solimões de tristeza. Mas eis que encontra Roseli. A mãe de Vanessa era filha de Dona Mulata, uma grande amiga de quem minha avó falava muito. E no meu quarto aniversário, lá estava aquela pequena que, anos mais tarde, me encontraria colega de classe.

Não é de se admirar tamanha afinidade. Nossas vidas se encontraram na infância e na juventude. Partimos por outros assuntos, mas estaremos sempre juntos. Em "Papai, me compra um amigo?" de Pedro Bloch, me vi Bebeto, o menino com extrema dificuldade de relacionamento que descobre em Paula uma grande companheira capaz de ajudá-lo a superar a timidez. Vanessa é pra mim muito mais do que isso. Amo-a de qualquer maneira, pra vida inteira.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

A bênção da leitura

A reportagem de capa da Veja de 18 de maio veio à feição. Num país tão espinafrado pela má qualidade de sua educação, a chegada de uma geração que gosta de ir além das fronteiras de Harry Potter é um achado - bem verdade que isso ainda não atinge ao grosso da população, mas pode ser a ele estimulante. E então fui fuçar no meu baú.

Nele encontrei Maluquinho, o menino serelepe e faceiro que segurou o tempo e é mais do que um cara legal. Viva Ziraldo, que desenhou mais do que uma história, mas um clássico da literatura infantil.

Mas ora que tão faceiro Maluquinho chama Bebeto, aquele que queria comprar um amigo, tão tímido que era. Não precisou: Paula chegou em sua vida e o fez crescer e vencer. De qualquer maneira, eles se amam é pra vida inteira.

De lá vêm também os primeiros personagens de um livro adulto, Escrito nas Estrelas, de Sidney Sheldon - sim, eu o li, e gosto pra caramba. Torci para que Howard Keller terminasse com a megaempresária Lara Cameron, mas não foi bem isso o que aconteceu. O homem da vida dela era o pianista Phillip Adler.

Da safra sheldoniana ainda surgiram Catherine, Costa, Jennifer Parker, Michael Moretti e por aí vai. Tantas histórias tristes culminaram em finais apoteóticos - não necessariamente felizes. Aí, também descortino Zíbia. Afinal, os Espinhos do Tempo não apagam os Laços Eternos ou ferem a bondade do Matuto. Afinal, Somos Todos Inocentes perante os Advogados de Deus.

Estes foram os meus Harry Potters para paragens mais densas. Já tive de ler Vidas Secas a contragosto, e assim não o fruí. Mas ainda que para a Fuvest, Dom Casmurro de materializou numa maravilhosa busca pela mente machadiana - que nem mesmo da sua morada espiritual há de desvendar o mistério de Capitu.

Pelas hostes de Joaquim Maria ainda vieram os Pedro e Paulo, ferrenhos rivais pelo amor de Flora, Iaiá, o matuto Rubião e sua teimosa paixão por uma mulher casada, o o impagável Brás Cubas (a meu ver belo, mas menos brilhante que o Casmurro Bentinho) e Simão Bacamarte, que inverteu a lógica da loucura.

Eis que visitei o Cortiço de Aluísio e me acabei nas festas de Rita Baiana - houve quem fizesse da casa a protagonista da trama. E Bertoleza sofreu nas mãos do patrão português. Mais adiante, a Casa de Pensão ainda fervia com a rivalidade entre Amâncio e o cunhado, João Coqueiro.

Aos 27, me vi maduro para revisitar Graciliano. Vidas Secas é secamente belo na saga de Fabiano e família, mas perde para a graciosidade canalha de Macunaíma, em sua fantasia que remete aos Cem Anos de Solidão dos Buendia.

Nem só de ficção vive a minha fase dita culta. Descortinei a Bossa Nova em todas as suas fases, o Anjo Pornográfico Nelson Rodrigues, a saga comunista de Olga Benário e a autodestruição de Mané Garrincha. Como viscerei no terrívelmente real Estação Carandiru e voltei em uma passagem da gênese nacional em 1808 - e pude entender muita coisa dos nossos problemas brasileiros.

E olha que essa é apenas a primeira página dessa história. Há muito por desbravar.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Versos jogados ao vento

Eu queria dividir um verso com meus parcos leitores (pra não dizer nenhum).

Gostei de tê-los produzido, apesar de a pessoa pra quem fiz não merecer tamanha honraria.

Mas é como um amigo já me disse: essas coisas nós fazemos muito mais para nós.

Espero que gostem


Despertar

Cruz

Andarilho das sombras

Herdeiro das pragas

Andança

Nas costas, solidão

No corpo, escuridão

Divindade

Mimetiza brilho e sonho

E me apaga do deserto

Luz

Envolvido, vivi

Olhares por aí

Sorrisos eu ouvi

Mas tudo em um só sublime

Só em ti.

Saudade

Te contemplava estática

A essência, só amostra

Minha angústia errática

Você não se me mostra

Esperança

A luz se desfaz em areia

Será que a deusa se vai?

Atropelado pelo desencanto

Ainda assim, me levanto

Sigo caminheiro pelo sertão sem fim

Será que gostas mesmo de mim?