domingo, 22 de julho de 2012

A legitimidade do ressentimento

Uma reportagem do Esporte Espetacular foi a cereja do bolo de uma reflexão que, por motivos pessoais, há algum tempo eu vinha fazendo.

Luis Figo, ex-craque da seleção portuguesa, esteve no Rio para divulgar um movimento para beneficiar jovens carentes via futebol. Tratava-se de uma competição que dava aos vencedores oportunidades de treinar em grandes clubes. Os campeões ganhavam uma semana no CT da Inter de Milão. Quem ficava em segundo iria para o Fluminense.

Consolado pelo pai, um menino copiosamente derramava o choro da derrota, talvez uma entre tantas a que terá de se habituar. Em criança, ainda terá as lágrimas toleradas. Mas, quando crescer, terá de se tornar um forte - afinal, homem não chora.

Um conjunto de normas da vida (não gosto muito de falar em sociedade, porque soa clichê) fala muito em aceitar rejeições e derrotas. Infundem pressão para não "fraquejar", como se fácil fosse pra digerir. Como se não pudéssemos ligar o mecanismo da frustração inerente a situações assim.

Tal imposição pode ser vista com particularidade no universo afetivo. Certa vez, o filho de um amigo, meio desajeitado nos tais jogos da conquista - palavras dele mesmo, porque não sei se existe "o certo" em horas assim - encantou-se com uma simpática moça com quem estudava. Tentou chegar perto do seu jeito, e a chamou pra um café. Eis que a moça devastou todos os sonhos: percebeu o interesse e disse, de modo nada gentil, que já estava em outra, "tava muito legal" e "não tava afim de criar problemas no relacionamento". 

Como "lidar" com uma coisa dessas? Fingindo que nada aconteceu? É correto lugar-comum reconhecer a legitimidade da opção da menina de não estar afim. Mas não será direito dele, também, ficar decepcionado com ela?

É óbvio que aqui não vão incluídas as portas na cara levadas na balada: ir ao divã porque levou toco na pista de dança é demais. Mas situações mais profundas demandam lá o seu luto particular. Tristezas, revoltas,  ressentimentos e sedes de vingança, se não devem virar modo de vida, também não podem ser varridas pra debaixo do tapete em nome de uma suposta iluminação. A meu modesto ver, a tal purificação espiritual depende da vivência destas emoções.

Pra lá de magoado - menos pelo fora em si do que pela forma agressiva com que foi dado - o menino quebrou as tais"regras": deu um gelo definitivo e sequer dá bom dia. Aos poucos levanta, sacode a poeira e até tenta dar a volta por cima. Mas, embora um tanto exagerada, a atitude advinda da mágoa é, sim, muito válida.