domingo, 26 de agosto de 2012

Um samba pra lá de Mazzaropi

O ano carnavalesco que desemboca em 2013 já começou. Definidos os temas, compositores lançam mão do enredo para viver o sonho de levar uma obra pra avenida.

A Acadêmicos do Tucuruvi, vice-campeã de 2011, presta reverência ao centenário de Amácio Mazzaropi, o paulistano criado em Taubaté que traduziu em arte a figura do homem do campo de sua época. A obra do artista compreendeu passagens por circo, rádio, TV e cinema.

Composta por campeões deste ano, a parceria de Barba, Jelleya e Alemão conta ainda com Felipe Mendonça, Maurício Pito e Leandro Franja. Mais do que acertar mais uma vez, o grupo conseguiu ultrapassar seus próprios limites.

Barba conta terem eles ido além da sinopse: viram 6 filmes, leram o livro e visitaram o museu. Tanta preparação resultou numa obra à altura de Mazzaropi.

Alternando o foco narrativo do folião ao artista, o samba tem a levada alegre, tão característica da União da Ilha, sem abrir mão da poesia. Mazzaropi parece emocionado ao começar a contar sua história. Usa a frase feita, mas não deixa de ressaltar que "Minha fantasia é feita de amor" e "O teu sorriso me faz feliz".

Mas não se engane que o "maior dos caipiras" é matreiro que só. Num átimo puxa um sorriso com o inspiradíssimo refrão central. Saca da ironia e crava: "O Jeca Tatu não é puritano/ Há! Há! Há!/ Ele é corintiano".

E então torna, novamente terno, a relembrar da fase midiática. O público continua crucial, pois que é imagem e semelhança ("Na tela da TV eu fiz/ Espelho pra gente se ver"). E o final, certeiro, trata com extrema felicidade a morte do artista - a leucemia levou Mazzaropi em 1981. Obra e carnaval, no entanto, o eternizam. Mazzaropi é estrela não só porque parte, mas porque é arte. 

Essa mistura de irreverência e lirismo tem pela frente ótimos concorrentes. Ainda assim, dá à agremiação da Cantareira uma enorme possibilidade.

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

A glória discreta de Arthur Zanetti

A trajetória contemporânea da ginástica artística brasileira contemplou Luiza e passou por Daniele, Daiane, Diego e Jade. Garimparam vitórias importantes em Mundiais. Diego Hypolito foi bicampeão no solo, em Melbourne (2005) e Stuttgart (2007). Também no solo, Daiane dos Santos venceu na americana Anaheim (2003). E Jade Barbosa conquistou um expressivo bronze no individual geral de Stuttgart. Nenhum deles, no entanto, conseguiram traduzir a aventura em conquista olímpica. Coube a um discreto paulista de São Caetano ser o primeiro a inscrever tal glória na história esportiva brasileira.

A medalha de ouro de Arthur Zanetti não era cogitada pelo torcedor pouco afeito ao esporte. Mas quem acompanha com um pouco mais de assiduidade já poderia esperar coisa boa vinda dali. A primeira vez que o vi competir foi quando ainda atualizava um blog chamado Planeta Esporte. 

Era 2008, e ele se classificava a duas finais da etapa eslovena da Copa do Mundo, uma competição menos expressiva do que os Mundiais e as Olimpíadas. Fora terceiro colocado no solo e sexto nas argolas, a sua especialidade. À época, o aparelho ainda tinha no trono o holandês Yuri Van Gelder e atletas mais experientes, como o francês Danni Pinheiro. Parecia ser bom atleta, mas não carregava cartaz. Ainda assim, eu dizia a mim mesmo: é bom guardar este nome.

Até que, no mundial de Londres, no ano seguinte, o cara tirou um surpreendente quarto lugar, com 15.325, a 2 décimos e meio do primeiro colocado. Dois anos depois, em Tóquio, a nota sobe 275 milésimos (15.600) e ele vai ao pódio: só fica atrás do chinês Ybing Chen.

Arthur chegou a Londres credenciado. Dele, no entanto, pouco se falava. Apostava-se em Cielo, Fabiana, vôlei, futebol. Enquanto estes ainda figuravam na linha de frente, ora vencendo aos trancos, ora conseguindo menos do que almejava, ora sucumbindo ao vento, Arthur ziguezagueava pelos flancos, sem dar bola pra fama. Optou por um exercício mais conservador na fase inicial e se satisfez com o quarto. Guardava na manga uma carta mais matreira. Apresentar-se-ia por último na decisão.

Chen e o italiano Matteo Morandi tinham feito grandes apresentações. Sem olhar para o lado, fez o seu. Nem mesmo a leve imperfeição do pouso abalavam o alívio de ter bem cumprido a missão. Os 15.900 finais  selaram uma inédita medalha de ouro. 

Aqui encerra-se uma história e, espera-se, começa outra. Que o Brasil crie juízo e faça de Arthur a referência para a criação de futuros campeões.

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

São Paulo em 140 toques

No porto onde as pessoas pegam os seus sonhos ao chegar ou, já disperso deles, se vão, arte resume em  som e dança; canto e corpo, a maluca metrópole.

Como um microcosmo de si própria, microcosmo do mundo, numa miríade tons migrantes se abrem. O Rio, a Bahia, o Centro-Oeste. E ela própria.

Tão democrática, não se envergonha de, na mesma colcha de retalhos que tão lhe é peculiar, misturar o  clássico corpo dourado do sol de Ipanema ao indecifrável tchutchatchá. Ivete, como sempre, premedita o breque.

Assim, "da japonesa loura à nordestina moura", independente dos seus governantes, a cidade se encontra, se discute, se reinventa. Nem que seja na forma de som e corpo; canto e dança.

A gigante Rodoviária do Tietê; da imensa São Paulo; do imponente Brasil.