O esporte, o jornalismo e a literatura estão de luto.
O artesão das palavras parte para a eternidade.
Obrigado pela semente em mim plantada, mestre Armando.
Vai com deus.
terça-feira, 30 de março de 2010
sexta-feira, 12 de março de 2010
Uma saga paulistana
O meio-dia já luzia a pino no céu. Depois de um Saara repleto de marasmo, um pequeno oásis: treinamento para um freela como pesquisador do Datafolha.
Começava a uma hora, e daqui para o centro não era uma caminhada das mais extenuantes. Carreguei o bilhete e fui tomar o ônibus. Calculei que chegaria com uns 10 minutos de antecedência. Só que uma maldita manifestação de professores me pregou uma peça.
O mar incandescente característico do rush paulistano entrou em tsunami antes do tempo. Da Teodoro à Consolação, mais de meia hora. Desci e peguei o metrô. Seria uma viagem cheia de vaivéns. E o tempo seguiu o seu curso inabalado. Apertou o prazo.
Agora, cada segundo tornou-se uma raridade. Cada parada excedia a tensão. O que era para ser uma vantagem, adversidade. O Paraíso pareceu um purgatório, e fiz o caminho inverso das almas perdidas, rumo à Sé.
Na Linha Vermelha, o dérbi da cidade se eternizou. Corinthians de um lado, Palmeiras de outro. Sumo sacrilégio: Tive de ir para o lado alviverde. Purguei o pecado na Santa Cecília.
Uma e pouco! Já meio distante da pontualidade, troquei a divindade pela história. O Duque de Caxias levou-me ao Barão de Limeira. Para meu alívio, a deselegância discreta da impontualidade brasileira passou-me o pano na testa.
Tantos como eu desempregados pouco a pouco se apresentaram. Uns já formados, outros versados em pesquisa, todos necessitados.
No intervalo, conversei com duas colegas. Uma fizera contabilidade e trababalhara com "pessoas em situações de risco", como moradores de favelas, por exemplo. Tinha acabado de trocar João XXIII pela Bela Vista. A outra morara em Marília e estuda ciências sociais na PUC. Na saída, a moça ainda se perdia no meio daquela babel chamada São Paulo. Ainda iria à aula dali.
Na volta, mais uma vez traí o meu coração. E paguei caro por isso.
Achei que tomar um ônibus na Barra Funda seria melhor do que virar sardinha nas baldeações do Metrô. Mas me vi entalado no caos da Sumaré. Tão parada que desci antes para ir a pé pra casa. Uma moça loira teve a mesma ideia. Pareceu me seguir. Mas apenas ia para o mesmo lado.
"Você também vai para o Largo da Batata?" Perguntou!
Disse que pararia antes. Mas, como o papo tava muito bom, estiquei a caminhada de propósito. Era uma paulistana de Belo Horizonte, com mineirês deliciosamente acentuado. Despediu-se nas proximidades do Largo, e eu tive ímpeto de ir atrás dela. Mas dei a volta e fui pra casa. Parece que o jogo começa a virar.
Em todos os sentidos.
terça-feira, 9 de março de 2010
Diário de Bordo: Rumo ao Rio
Pareceu uma briga de deuses. De um lado, Hércules queria que eu fosse. Mas Poseidon fez de tudo para impedir. Mas o heroico semideus vencey a batalha.
Embarquei no Expresso Brasileiro do meio-dia e quinze rumo ao Rio. Faria reciclagem de um curso destinado a homens ministrado na Irmandade.
A primeira parte da viagem foi um misto de leitura e descanso. Passei na loja de revistas do Tietê para comprar um jornal. Levei o Estadão e comecei a ler a partir da capa. Almir Pazzianotto criticava duas leis trabalhistas propostas pelo governo: uma obrigaria as empresas a destinar parte dos lucros aos funcionários; a outra reduziria a jornada para 40 horas semanais. Carlos Alberto di Franco refletia o jornalismo, que para ele estava mais discursivo do que investigativo.
Paramos no Graal de Lorena. Caríssimo! Um conjunto de sanduíche simples de queijo e suco de caixinha beirou os 10 reais. Naquele momento, já me chamava a atenção um sujeito com camisa do Real Madrid (com o nome do Kaká) e calção do River Plate. Na poltrona ao meu lado, perguntou as horas, mas adiantou que não falava português. Como viu que eu tinha alguma familiaridade com o inglês, começou a puxar papo.
Darren é um jornalista inglês que viajava o mundo cobrindo os mais diversos esportes. Disse que viajou a diversos países do mundo e sempre teve uma espécie de voz interior que o mandava ao Brasil. E não se arrepende. "As pessoas aqui são muito amáveis. Na Inglaterra elas não são assim."
Quando falei da diversidade da gastronomia nacional e citei a comida de Minas como uma das "especiais", ele lembrou-se de Gilberto Silva, meio-campista revelado no Atlético Mineiro. Darren disse ter conhecido sua esposa por acaso, e descobriu que, no tempo em que jogava no Arsenal, Gilberto morava a duas quadras de sua casa, em Londres. E lhe deu a sua camisa de jogo.
Falamos também de Copa do Mundo. Argumentei que o grupo do Brasil não era dos mais fáceis, porque, apesar de serem teoricamente inferiores tecnicamente, Portugal e Costa do Marfim poderiam fazer partidas equilibradas. Darren nnão crê em tantas dificuldades assim. Darren não gosta dos jogadores africanos. Para ele, são fortes fisicamente, mas não tão bons tecnicamente.
Eu disse a ele que, embora façam chover em suas jogadas, falta noção tática à maioria dos jogadores brasileiros. Além disso, muitos deles não se adaptam ao exterior, e voltam logo. As exceções são Kaká, Raí e Leonardo.
A essa altura, estamos enfim às portas do Rio, na Avenida Brasil. "Há muito trabalho a fazer até as Olimpíadas, hein?". Concordei, mas adiantei que o grosso das competições aconteceria na Barra, longe da zona central. Da rodoviária, nos separaríamos. Ele rumaria a Ipanema. Eu, à Tijuca. No balcão de informações, nos despedimos. Lembrei-me ainda do norte-americano Jake, amigo de um conhecido, que veio passar uns dias em São Paulo, e concluí que me tornara para-raio de estrangeiros por aqui. Será um sinal?
xxxx
Segui as orientações de casa, e perguntei por um ônibus que passasse na Praça Saens Peña. A minha sorte é que a moça do balcão da Localiza tomava um na volta pra casa, e me indicou o 606, que vai para o Engenho de Dentro (passa, inclusive, pelo Estádio Engenhão).
Tive um pequeno problema: o ônibus não tinha cobrador, para quem poderia pedir para descer perto do famoso Alzirão, onde há uma tradicional festa quando o Brasil joga nas Copas do Mundo. Preferi ir por conta, e torcer para dar sorte.
Na passagem pela rua Mariz e Barros, ele cruzou uma rua da qual ouvi falar nas outras vezes que estive lá, a São Francisco Xavier. Desci e andei por ela. Sabia que encontraria a minha referência principal: a Conde de Bonfim. Dei de cara com o Largo da Segunda-Feira. No primeiro momento, fui para o lado contrário, porque ela virou Haddock Lobo, mas depois me encontrei.
A Rego Lopes aparecia discreta do lado de lá daquele restaurante onde comi há coisa de um ano. Uma epopeia apaixonante, que teve lá os seus momentos de tempestade, culminaria com uma bonança: a aula do mestre Antonio Carlos de Azevedo Ritto.
sexta-feira, 5 de março de 2010
Johnny Alf: verdadeira estrela primeira da Bossa
Nasceu Alfredo José da Silva, pisando nas calçadas musicais de Vila Isabel. Não por acaso, debutou na música logo aos nove anos, tocando piano clássico.
Logo migrou para a música popular. Tinha paixão pelas trilhas sonoras de Hollywood. Amava Gershwin, Porter e Cole. A partir deles, criava melodias. Trouxe a bagagem ao seu primeiro conjunto musical, aos 14. Com um rapaz que tocava pandeiro e uma cantora, saía de Vila Isabel para tocar no Andaraí.
Tal afinidade o levou a fazer amizade com um pessoal do Instituto Brasil-Estados Unidos, onde entrou em um grupo artístico. Um dos integrantes do órgão, com a mania de simplificar, o chamava de Alf. Então uma amiga sugeriu que juntasse o apelido a um nome muito popular nos Estados Unidos. E a arte de Alfredo José ganhou nova identidade: Johnny Alf.
Efervescente, a turma multinacional fuundou um clube para disseminar as músicas brasileira e norte-americana. Com a volta ao Brasil de Farnésio Dutra, o Dick Farney, o clube passou a se chamar Sinatra-Farney Fan Club. Nessa época, precisou tingir-se de uma dose de teatro, já que conciliava o inconciliável. A interminável noite tocando no clube com o serviço militar como cabo na Escola de Sargentos das Armas de Realengo. Em 52, conheceu o animador Cesar de Alencar, que tinha uma cantina em Copacabana e queria um pianista.
O teste não chegou nem a terminar: Alf passara com honra. Mas isso representava um cisma com a família, que o queria burocrático. Não tinha jeito! Ou seguia o plano, ou teria de ganhar o mundo. Seguiu o seu próprio projeto.
Tocar para tanta gente era uma luta para o tímido Alf. E o público era tão refinado quanto o pessoal do clube - gente do quilate de Tom Jobim e Nora Ney. Lá, quem o ouvia era o maestro Radamés Gnatalli e um certo João, vindo da baiana Juazeiro. O esboço de uma tal Bossa Nova começava a se desenhar.
Na casa do general Victor Freire, compõs "O que é amar", um libelo sobre os conflitos com a família, com quem mal falava desde que optou pela Cantina. Naquele tempo, compõs ainda "Estamos sós" e "Escuta", peças do disco "Convite ao Romance, da rainha do Rádio Mary Gonçalves. Não demorou para lançar o seu próprio trabalho, em 78 rotações. Com ele, neste trabalho, a banda continha um contrabaixista (Vidal) e um violonista (Aníbal Augusto Sardinha, o Garoto), formação corriqueira no jazz, mas inédita no Brasil. Tais andarilhos atraíam a atenção de Silvia Teles, Roberto Menescal, Carlinhos Lyra e Ed Lincoln.
Por volta de 53, o retrato do que viria depois estava pronto, com nova harmonia e uma poesia mais solta de "Céu e Mar" e "Rapaz de Bem". Dois anos depois, sem mais nem menos, cruzava a Dutra e desembarcava em São Paulo.
Mal poderia imaginar que seria pivô de uma frase marcante de Vinícius de Morais. Tocava em um bar da cidade quando um grupo de bêbados reclamava do som. O poetinha tomou as suas dores e disse para Alf voltar para o Rio, porque "São Paulo era o túmulo do samba." Só que Johnny fazia jazz. Vinícius se retratou depois.
Já estabelecido na capital paulista como professor do conservatório Meireles, foi procurado pela cantora Marcia. Ela queria uma música para concorrer no Festival da Record de 67. "Eu e a brisa" já tinha o instrumental. Só faltava a letra. A canção fracassou no evento, mas ganhou posteridade algum tempo depois.
O precursor fazia shows esporádicos pelo interior de São Paulo. Humilde, contentava-se com a parca popularidade que a obra lhe deu. Se não era totalmente esquecido, seus shows não atraíam um público que se pudesse chamar de grandioso.
Em 4 de março de 2010, o corpo parou de funcionar. E uma grande alma se libertava. Pior para o Brasil, que perdeu muito e não se deu conta disso.
quinta-feira, 4 de março de 2010
Pimenta na boca?
O palavrão é o marginal da nossa sociedade. Que família tradicional não o combateu nos seus filhos, em nome das boas maneiras?
Prisioneiro na maioria dos lugares, o estádio é o lugar onde ele se liberta. E liberta quem o fala. Serve como arma contra a frustração de um gol perdido, uma infração injusta, a expulsão absurda, o defensor que perde o passo na hora H.
Pois eis que a Paraíba instaurou uma lei contra o nosso amigo até nas arenas? Batizada com o enfadonho nome "Pimenta na Boca", a igualmente esdrúxuula legislação que proíbe baixo calão e gestos obscenos nas partidas de futebol. Para os "legisladores", tais gestos incitam a violência.
Engraçado... existem medidas tão mais simples e efetivas do que essa para coibir as brigas. Isso chega a ser tragicômico, porque nada efetiva e antidemocrática.
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