Maria Osmarina nasceu na mata, mas é toda Mar.
Estava com a vida em turbilhão quando cheguei ao Teatro Folha naquela terça-feira. Era a sabatina de uma certa ex-ministra e já candidata a presidente. Mal sabia eu que novas torrentes estavam por vir.
Lá encontrei Juliano Spyer, grande amigo dos tempos de América Online. Ele já fazia parte da equipe de comunicação da senadora. Iria a uma entrevista logo depois do encontro. A vida começava a virar.
“Peço para que entre no palco a senadora Marina Silva”.
Um falso maremoto pintado sei lá por quem
Aquele caminhar continha uma serenidade para mim estranha. Me acostumei a vê-la retratada injustamente como uma represa ao desenvolvimento do país. À medida que falava, desconstruía a injustiça de tal imagem. A voz aguda transmitia inesperada doçura.
Graciosa bucolia vista da praia
Quando falava de pré-sal, citou trecho da obra-prima “Construção” e a colocou na conta de Caetano. Foi prontamente corrigida: “É do Chico”. Mas não se deixou abater. “É o inconsciente falando no Caetano, porque ele disse que vota em mim”. O brilho daquele sorriso me acertou em cheio. A verdadeira Marina começava a se moldar.
Três dias depois, eu já fazia parte da equipe de comunicação. Significava o recomeço de uma trajetória profissional bastante irregular. A minha estréia aconteceria na manhã seguinte, quando Fabio Feldmann seria confirmado candidato do PV ao governo de São Paulo.
A despeito do frio, a Assembleia Legislatislativa fervia, já que vários partidos também definiriam os seus passos na eleição. Juliano apresentou-me a ela, que me deu as boas vindas.
Das profundezas, o fim da calmaria já se anunciava
Ela já estava na tribuna do plenário para discursar aos militantes. Estava cercada de partidários, e eu precisava achar o melhor ângulo para filmá-la. Mas, à medida que o discurso fluía, eu me distanciava do mundo sensível.
E quando acabou, me vi totalmente tragado por aquela tsunami
Com o tempo, meu trabalho sofreu uma metamorfose. Era para ser cinegrafista, mas a cúpula achou melhor contratar uma equipe de vídeo. E aí, passei a cuidar da publicação dos vídeos. Nada que impedisse novos contatos com Marina, sempre adorável e atenciosa. Filmei o ensaio para o debate da Folha/UOL, e também pude conhecer um pouco de Guilherme Leal, homem igualmente admirável.
Parecia que tudo caminharia para uma barbada (sem trocadilho) para Dilma. Mas o escândalo tomou conta da mídia. Primeiro, ao noticiar a quebra de sigilo fiscal a gente ligada ao PSDB. Depois, com um suposto tráfico de influências envolvendo Erenice Guerra, então Ministra-Chefe da Casa Civil e braço direito da candidata petista.
Nunca Maria Osmarina Marina foi tão MAR
Eis que uma tal Onda começou a acender um sinal... Verde. Marina cresceu e apareceu na voz de celebridades. O clube que já tinha Caetano, Bethânia, Gil, Marcos Palmeira e Adriana Calcanhotto, arauto da gente (gente, gente...), ganhou Wagner Moura e Gisele Bundchen – uma adesão tão barulhenta que fez a luz desabar. Com eles, vieram outros milhões de brasileiros. E os oito ou dez pontos martelados pelas pesquisas viraram dezessete na aferição final.
A sexta-feira final foi agitada. Debaixo de um tempo claudicante, que oscilava entre chuva e vento, fui ao Viaduto do Chá, de onde Marina partiria em caminhada até a Praça da Sé. Só que o passeio durou dois passos, já que a saúde tão castigada ao longo da vida não permitia aventuras debaixo de aguaceiro. A militância fez o trajeto por ela, e improvisou uma dança aos céus em volta do Marco Zero de São Paulo.
De volta à redação, uma surpresa nos aguardava. Marina nos saudaria em agradecimento pelo comprometimento que, sabia ela, ia além da esfera profissional. Não dá pra definir o que senti naquele breve momento; a felicidade de tê-la abraçado durante aqueles três meses se fundiu à tristeza de perceber que, no fundo, o ciclo chegara ao fim.
No dia da eleição, sacrifiquei os meus corintianíssimos princípios e fui votar de verde. Marina e Guilherme sorrindo a minha frente representavam o limiar de um epílogo. A história terminaria de ser escrita ainda naquela noite.
Não deu pra chegar ao segundo turno, mas o que era dezessete nas pesquisas quase virou vinte no vamos-ver. O Espaço Crisantempo estava lotado para o pronunciamento final.
Nunca vou me esquecer daquela entrada. Triunfante, nem parecia que aquela artista teria de deixar o palco. O cansaço era tanto que a voz se sustentava num fio. Mas nem por isso perderia a doçura de sempre. No final, envolveu-me em mais um abraço carinhoso e reforçou a esperança em um novo país.
Obrigado por tudo, Marina. Esse é só o começo.
3 comentários:
Exatamente...foi uma saga fantástica para todos nós...o fim poderia ter sido melhor, mas mesmo assim....teve sabor de vitória!!!
Pelo visto vou continuar a me emocionar com textos, ideias, palavras, momentos, fotografias, cenas ou qualquer outro flash que aparecer desta vivencia ímpar que transcende a qualquer profissionalismo.
É interessante, bonito e gratificante como cada pessoinha daquele comitê tem sua história particular que nos uniu em algo tão grandioso que foi essa campanha Web. Todos nós temos sim o direito de ficarmps orgulhosos e profissionalmente realizados. Claro que a pessoa Marina Silva contribuiu com 50%, mas os outros 50% eramos nós lá, vestindo verde, mesmo sendo "contra" os princípios do Timão.. Hehehehe. Uma frase do agradecimento dela que eu gosto muito é: "(...) eu sei que as pessoas aqui não estão envolvidas só profissionalmente. Estão comprometidas e isso faz a diferença(...)"... E FEZ! Parabéns a TODOS nós, Fê... E, com certeza, nossos caminhos ainda vão se cruzar muito nestas indas e vindas da vida. Tenho certeza de que o fim da campanha não é o fim! Muito obrigada por ter feito parte da minha vida! Beijos
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