quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Desencanto

Ainda se habituava ao novo serviço. Depois de três anos amargando o estágio, virar secretária bilíngue significava um salto e tanto. A adaptação não fora fácil, mas contava com um chefe pra lá de paciente. Mesmo que, em muitos momentos, pintasse a vontade de desaparecer Espaço afora.

Já mais vivida na rotina, começava a soltar um pouco as garras do pudor. Foi tomar café na copa com Antônio Carlos, do setor de propaganda. E dois colegas dele chegaram pra bater um papo. Marcos era o elo de fora, com quem podia papear mais à vontade. Mas era o outro, Célio, que a interessava mais. Era belo, com um semissorriso tímido que a fazia corar. Mas nunca que conseguia um dedo de prosa com ele. Parecia nunca sair da casca. Nem parecia alguém que trabalhasse em comunicação.

Não parava de pensar no moço, mas sabia se manter. Parecia estar no caminho certo. Seus mentores do Astral sinalizaram um "menino" no serviço. Não tinha certeza se era ele, mas não contara a ninguém do interesse despertado. Dava bom dia à equipe, mas sempre olhava pra ele só de soslaio. Queria chegar mais perto, mas não via jeito. Apareceu uma chance com o crepúsculo do ano; o tempo em que todo o mundo desejava sucesso para si e para os seus e estava cheio de espírito seria ideal para algum gesto. Mas o elo entre os dois lados, Antônio, acabara de entrar em férias. Não tinha jeito: obrigou-se a esperar.

Quando ele voltou, segurou a empolgação e agiu no limite da cautela. Perguntou ao amigo se podia dar a ele uma lembrança, nem que seja pra ele saber que ela existia. Antônio recomendou que ela tivesse calma, pois seria imprudente qualquer movimento brusco. Afinal, não podia arriscar o emprego. 

Corou de vergonha ao ler a mensagem. Sabia que era um movimento ousado, mas achou que ganharia sinal verde. Afinal, escondeu-se por muito tempo das coisas, e aprendeu que grandes conquistas às vezes prescindem de sensatez e lógica. No fim das contas, não se arrependeu de ter ao menos ensaiado uma tentativa. Ora, o que de pior poderia acontecer? Por mais ilógico que fosse, seria uma estupidez ser mandada embora por uma intenção. Sossegou um pouco.

Célio e Marcos, sempre grudados, rarearam na copa. Um dia apareceram, e ela resolveu ficar um pouco. Já dava tempo para ela ter alguma ideia de quem era ela. Ficou na sua, e só observou. Nem lhe dera bom dia; não dava pelota de sua presença por ali. Conversavam os dois baixinho, como se ela mal existisse. Foi embora com uma despedida discreta aos demais. Custava ao menos ter um pouco de simpatia? Na pior das hipóteses, deveria ao menos ter educação. Nem isso.

Foi embora com uma sensação de mágoa na garganta. Da cabeça aos pés, exalava boa dose de decepção. Sentiu-se uma completa idiota cheia de carência. Talvez fosse melhor fazer o seu e partir pra outra.

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