A Casa das Rosas foi, na última quinta-feira, palco do lançamento de uma obra fundamental para a cultura afro-brasileira: o Dicionário Literário Afro-Brasileiro, do advogado, pesquisador e músico Nei Lopes.
Nascido em Irajá, subúrbio do Rio de Janeiro, Lopes graduou-se bacharel pela Faculdade de Direito da Universidade Brasil. Mas trocou as leis pela música popular. Mais precisamente, o samba. Teve em Wilson Moreira o seu maior parceiro. E, com ele, deu impulso ao pagode de fundo de quintal.
Cheguei por volta das sete e quinze noite. No caminho da estação Brigadeiro do Metrô, encontrei uma longa fila. Por instantes, achei que era para entrar na casa, ainda um pouco distante. Mas se tratava do público de uma peça de teatro.
Em rápida preleção, Lopes conta que preferiu lançar a obra em São Paulo por encontrar aqui um movimento negro mais organizado do que no Rio. Na obra, está verbetizada uma gama de artistas não apenas afro-descendentes, mas também representantes de outras etnias que escreviam sob a ótica afrodescendente.
Lopes comentou ainda que, em conversa com a esposa, definiu que, em termos de mobilização do movimento negro, São Paulo está para o Rio assim como os Estados Unidos estão para o Brasil. "Lá há cotas em todos os segmentos. Se num filme há um policial de ascendência européia, ao lado dele há um negro."
Depois do discurso, autógrafos e rodas de amigos. Como estava sozinho, aproveitei para conhecer todas as dependências da casa. De arquitetura clássica, inspirada em modelo francês, ela foi projetada por Ramos de Azevedo e concluída em 1935, para servir de morada a sua filha Lúcia, à época casada com o engenheiro Ernesto Dias de Castro. Permaneceu residência até 1986, quando foi desapropriada e tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo. O governo do Estado a reabriu 5 anos depois, como galeria de arte. Em 2004, tornou-se Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura. Ganhou o nome de Casa das Rosas porque essa era a flor que mais povoava o seu jardim.
No andar de cima funciona uma pequena biblioteca, uma sala de aula e um terraço, que dá para os Jardins, de costas para a Paulista. Nos belos jardins da casa, obras de arte feitas em letras. No térreo, duas salas. Numa, Lopes dava os seus autógrafos. Outra, do lado oposto à recepção, um pequeno espaço guardava móveis pertencentes a Haroldo de Campos. A força da grana que ergue e destrói coisas belas, como disse Caetano certa vez, não destruiu esta preciosidade. Mas ela precisa de uma reforma em sua parte superior.
Que a Casa das Rosas seja, como quer Nei Lopes, um ponto de irradiação da arte afro-brasileira.