sábado, 21 de maio de 2011

Vanessa, a "Paula" da minha vida

Pena, que pena
Que coisa bonita
Diga qual a palavra
Que nunca foi dita

A primeira semana de aula estava prestes a terminar. E a última aula, Antropologia Cultural, não parecia dar futuro. O professor, Celso Prudente, parecia saído de um clássico da literatura de tão difícil que falava. Num instante, para me chamar a atenção, o cara virou pra mim e disse:

"Ô ilustre, mora aqui. Depois, você deriva"

Que diabos era aquilo? Talvez significasse que eu devesse me concentrar mais na aula, ou algo assim. A verdade é que o Celsão era doidaço, mas também muito boa gente. E o nosso amigo serviu de ponto de partida para uma das histórias mais bonitas da minha vida - Vanessa.

Na saída para o ponto do ônibus, divagamos sobre aquela aula nada ortodoxa. Fui no mesmo ônibus que ela - não sei se Shopping Continental ou Jardim Maria Luiza, mas era um desses. Só sei que era caminho para casa e a acompanhei. E cada vez mais nos sentimos de alguma forma afinados.

Também juntos ríamos e nos perdíamos. Uma vez, na aula de História da Comunicação, o José Maria das Neves balbuciava a sua aula, e nós não prestávamos lá muita atenção - porque a base da nota era um trabalho de temas prestabelecidos. Aí, ela levanta a mão e pede para ele falar mais alto. Ao que ele responde: "Minha filha, a aula já acabou!"

Descobri que, quando cantava os tantos sucessos da MPB, sua voz parecia deslizar o horizonte, de tão poderosa. Como ela sempre fora! Assim aconteceu naquela viagem ao Pontal do Paranapanema, para onde fomos desenvolver uma série de trabalhos. Uma jornada das mais inesquecíveis.

Vanessa era explosiva e acolhedora. À época, namorava Roberto, um sujeito às vezes brigão, mas de um coração que mal cabia em si de tão grande. No meu 22º aniversário, os dois me ligaram para dar os parabéns. Parece pouca coisa, mas pra mim significou muito - eu nunca fui dos mais populares. Ganhava cumprimentos tão somente dos familiares.

No último ano, tive de me ausentar da faculdade para tocar um projeto experimental que se revelaria mais tarde um fracasso. Ouço então um recado dela na minha secretária: "Estou preocupada. Você não tem ido à faculdade". Nunca havia pensado que alguém sentiria a minha falta.

Fui uma espécie de quinto elemento de seu trabalho final. Eles fizeram um documentário sobre a cidade de São Paulo, e eu fiz a narração. Mesmo não fazendo parte do grupo de forma oficial, fiquei feliz de ter feito parte daquela iniciativa, que tirou nove e meio.

Na festa de formatura, descobri que a vida real, às vezes comum, pode de quando em vez guardar lances extraordinários. Minha mãe tinha acabado de perder minha avó e meu tio para a Eternidade, e se sentia um tanto sozinha. E o Negro de felicidade se unia a um Solimões de tristeza. Mas eis que encontra Roseli. A mãe de Vanessa era filha de Dona Mulata, uma grande amiga de quem minha avó falava muito. E no meu quarto aniversário, lá estava aquela pequena que, anos mais tarde, me encontraria colega de classe.

Não é de se admirar tamanha afinidade. Nossas vidas se encontraram na infância e na juventude. Partimos por outros assuntos, mas estaremos sempre juntos. Em "Papai, me compra um amigo?" de Pedro Bloch, me vi Bebeto, o menino com extrema dificuldade de relacionamento que descobre em Paula uma grande companheira capaz de ajudá-lo a superar a timidez. Vanessa é pra mim muito mais do que isso. Amo-a de qualquer maneira, pra vida inteira.

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