quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Trajeto

Nuvens fechavam o céu; chuva duradoura se insinuava. O trânsito da Francisco Morato obedecia a um início de tarde tranquilo, como nem sempre acontece na metrópole. No ponto, a bucolia de uma moça que falava ao celular e de um casal adolescente que exalava paixão. No bar em frente, ébrios de sempre se arrastavam pelas paredes. E o ônibus que não chega!

Acabara de preencher ficha e se submeter a uma prova de inglês. Sempre impaciente, o ônibus não chegava de jeito nenhum. Mas, se viesse lotado, não tomaria. Preferia se abraçar ao estresse da pressa a entender é dura a vida de uma ervilha enlatada.

O Praça da Bandeira obedecia aos seus requisitos; havia até lugar pra sentar! Poderia abandonar a realidade, ainda que por instantes, para mergulhar na leitura. Mas o pensamento não parava quieto. Ora observava o desenrolar de "Iaiá Garcia", ora voava em um futuro que ainda não chegara. E talvez nem chegaria.

Uma terceira via arrancava todos os devaneios. Sempre munido do script de sempre, um ambulante andarilho vendia quinquilharias: doces, balas e afins. Apesar do eterno discurso, escapava de vitimizar-se. Agia como vendedor. Educadamente, dispensou os seus serviços.

Quando o coletivo se preparava para subir a ponte, outro transeunte chamava a atenção. Dessa vez, o voluntário de uma organização que cuidava de dependentes químicos. Distribuía canetas que continham mensagens bíblicas e um aviso que prevenia o público dos falsos vendedores. Fez um gesto de impaciência, mas acabou comprando a caneta.

Desceu na Consolação. A confluência com a Paulista, pra variar, apinhada de gente. Misturou-se ao mar de gente mergulhado em esperança.

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